Você já pensou nisso? Vale lembrar que o resultado a longo prazo é uma soma de várias decisões de curto prazo
Por Marcio Motter
Existem gestores que tomam decisões pensando o resultado do trimestre e quando muito no resultado do ano. O mesmo acontece com os gestores governamentais os quais estão preocupados com o tempo do mandato. Em ambos os casos não estão preocupados com o que vem depois; se ele continuar, vai dar algum jeito, se não continuar alguém paga a conta.
Todos nós tomamos diversas decisões de curto prazo e algumas até podem impactar no longo prazo, por exemplo: em uma crise se algo não for feito para resolver a situação daquele momento, pode não haver o futuro para ser tratado. O que precisamos ter claro é a situação que estamos, quais alternativas temos e os impactos da decisão no curto e longo prazo.
Acredito que a política de metas das empresas são as que mais geram o conflito entre curto e longo prazo. Pior: muitas empresas trabalham com metas individuais para os seus gestores o que gera conflito até no curto prazo, por exemplo: o time de vendas quer reduzir o prazo de entrega, o que aumenta o custo de entrega e impacta o orçamento da logística.
Para dar maior fluidez e melhorar a compreensão, vou citar situações que eu vivenciei, porém, para manutenção do sigilo, vou dizer que todos elas ocorreram na empresa “Exemplo Ltda.”
Uma delas foi quando o Controller propôs mudar o modelo de contabilização do custo de venda. Isso facilitaria o trabalho dele, porém a ampliação ou manutenção da carteira de clientes (longo prazo) seria comprometida se alguma campanha de vendas fosse cortada para cumprir o orçamento (curto prazo). Felizmente consegui convencê-lo a manter como era.
Uma outra decisão da direção da “Exemplo Ltda.” foi impor um limite no valor da comissão mensal dos vendedores (curto prazo). Por não serem comissionados por vendas feitas, alguns vendedores paravam de vender ao atingirem o limite máximo de comissionamento. Isso gerou desgaste na relação entre gestão e operação, perda de vendas e perda de tempo porque a empresa precisou voltar ao modelo anterior de comissionamento.
A “Exemplo Ltda.” não permitia que despesas orçadas e não realizadas em um trimestre fossem utilizadas nos trimestres seguintes, o que não é um problema sendo uma economia.
O problema ocorre quando o gestor sabendo que o orçamento do próximo ano será baseado no gasto real deste ano, decide antecipar despesas de trimestres futuros criando um círculo vicioso: para atender meta de curto prazo, impacta-se o longo prazo.
Na minha opinião todo gestor tem que melhorar a eficiência, eliminar desperdício e reduzir atividades que não agregam valor, desde que isso não impacte a qualidade do produto ou serviço prestado. Se impactar, isso será percebido pelo cliente e, quando percebido, poderá levá-lo a buscar uma alternativa em um concorrente.
Não chegamos a perder clientes na “Exemplo Ltda.”, mas continuamos com problemas na linha de produção em função de uma decisão de economia no curto prazo (reformar um equipamento obsoleto), ao invés de uma decisão definitiva de longo prazo (comprar um novo). Detalhe: a reforma custou cerca de 60% de um novo.
Por outro lado, um corte de custo bem pensado pode não só impactar o curto prazo, como mudar de forma permanente o padrão de uma indústria, como é o resumo abaixo de um caso do livro “Oportunidades disfarçadas” (Domingues, Carlos; Rio de Janeiro: Sextante, 2013, pag. 76 e 77).
A diretoria da empresa estava reunida buscando alternativas para baixar o custo de fabricação do seu principal produto. As ideias apresentadas foram as óbvias: trocar a matéria prima por uma mais barata, trocar fornecedor ou renegociar preço, até que o faxineiro que estava na sala perguntou “O produto precisa ter embalagem?”
Passado o primeiro impacto da pergunta feita pelo faxineiro, a avaliação foi: o produto não precisava de embalagem. Desde então todos os pneus (era esse o produto) são expostos nos pontos de venda sem embalagem.
Decisões de curto prazo sem considerar os seus impactos no longo prazo não estão relacionadas apenas à gestão de metas ou custos; também estão presentes na operação de algumas indústrias, por exemplo: construção civil.
É fácil encontrarmos no material de lançamento de alguns prédios em São Paulo a menção do quão perto estão de praças, estações de metrô, de bares, restaurantes e comércio. Vale lembrar que são os remanescentes, uma vez que vários deixaram de existir para dar lugar ao prédio que está sendo vendido.
Também precisamos considerar que estes comércios correm risco de não existirem mais no médio prazo; a área que ocupam pode ser incorporada para a construção de outros prédios que venham na carona. Ou seja, o que hoje é apresentado como um diferencial, pode deixar de existir no segundo momento em função da continuidade do processo.
São muitos que perdem:
- o consumidor que comprou o imóvel contando com o comércio na proximidade, que pode não mais existir quando ele se mudar;
- os comerciantes que perderam os seus negócios para dar lugar ao novo empreendimento; e
- os empregados do comércio que perdem os seus empregos.
Uma decisão tomada pensada no curto prazo impactará o longo prazo, e vice-versa. O que precisamos ter é clareza na relação de causa & efeito.
Você tinha pensado nessa relação entre curto e longo prazo? Como funciona na sua empresa? Compartilhe comigo a sua experiência.
Marcio Motter é Conselheiro associado da Conselheiro TrendsInnovation, Executivo Financeiro com mais de 25 anos de experiência em Tesouraria, Controladoria, Planejamento, Fusões & Aquisições, Relações com Investidores e emissão de títulos de dívida (bonds e commercial papers) em diferentes setores (publicação, restaurantes industriais, defesa e eletrônicos). Ao longo de todos esses anos ele atuou próximo às áreas de negócio viabilizando alternativas consistentes com a estratégia da empresa e não apenas no controle de custos, despesas e processos; gerindo os riscos das operações e não levantado empecilhos ou limitações para a realização delas. É autor do e-book “Aumente o seu lucro sem aumentar o preço”, titular da coluna “Finanças e Gestão Financeira” da Cloud Couching” e mentor do InovAtiva desde 2017.