A importância da função na estrutura do Conselho
A evolução natural das organizações com suas complexidades requer um ritual de gestão bem estruturado, podendo exigir, por ordem legal ou estrutural, a constituição de um Conselho de Administração ou Conselho Consultivo.
A dinâmica do dia a dia do conselho varia em função do tipo, se de administração ou consultivo, do tamanho e complexidade da organização, seu nível de maturidade em termos de governança e natureza jurídico/societária.
Diferente da avaliação de uma gestão ou gestor, no que se refere ao Conselho, não existe uma boa ou má gorvernança. O que existe é “Governança”. Nesse contexto, surge a figura de um profissional importante para “bater o bumbo”, dar o ritmo e ajudar os membros envolvidos no e com o Conselho. A função desse professional é a Secretaria do Conselho de Administração.
Essa função é recente nesse universo e recebe ao redor do globo vários nomes, que poderíamos chamar de cargo. Sim, cargo, porque a Secretaria do Conselho de Administração é uma função executiva.
Veja algumas nomenclaturas desse cargo:
- CS – Company Secretary
- CGO – Corporate Governance Officer
- BGO – Board Governance Officer
Daqui por diante vamos nos referir a esse cargo como BGO.
Contrário ao senso comum, esse cargo não é de caráter administrativo ou eminentemente burocrátivo. Como dissemos acima, ele é executivo e pode inclusive ter uma equipe de apoio, se a estrutura permitir.
Um dos papéis do BGO é fazer a ponte entre os agentes, órgãos e mecanismos de governança, como comitês, diretores, gerentes de governança e o Conselho, garantindo uma fluidez de informações relevantes, endereçadando-as para cada competência para deliberações e garantindo também o fiel registro de dados e atos.
A estrutura da governança requer uma integração que é capitaneada pelo BGO entre as instâncias (de acordo com a estrutura existente):
- Deliberativa: assembléia geral e conselho de administração (sócios);
- Executiva: CEO e Diretoria (administradores e áreas específicas de gestão como jurídica, planejamento, financeiro, recursos humanos, compliance, relação com investidores, auditoria interna/externa)
- Fiscal: conselho fiscal, comitê de auditoria, auditorias interna e independente
- Consultiva: comitês, de auditoria, de rccursos humanos, de remuneração, de riscos, responsabilidade social, de inovação, de estratégia, de sucessão)
Em razão dessa integração, e por se tratar de uma atividade que é conectora da alta administração com os órgãos de governança, a boa prática recomenda que o BGO deve se reportar ao Presidente do Conselho para evitar viéses, para que ele tenha autonomia e imparcialidade nas suas interações (conflitos de agência). O BGO deve ficar atendo ao sistema de governança, na sua evolução e melhoria, cuidando de aspectos organizacionais, legais e regulatórios. Daí a exigência de maturidade, conhecer a organização em seus detalhes operativos, normativos, cultura organizacional, seus regulamentos e legislação aplicável ao setor de atuação.
Outra questão importante no papel do BGO é o de facilitador e orientador aos diversos agentes da governança quanto aos seus direitos, deveres e obrigações, garantindo assim, o fiel registro da informações, requerimentos, atos etc.
Inicialmente a função da secretaria de governança era restrita ao apoio e suporte às reuniões do conselho. Hoje temos um escopo ampliado e rico que incluem entre outras:
- Pensar na melhoria dos processos e estrutura de governança;
- Manter atualizados os mecanismos de compliance;
- Suporte às assembleias;
- Suporte aos comitês
- Suporte à elaboração do relatório anual, nos aspectos que diz respeito à governança;
- Participar do processo de avaliação do conselho e conselheiros;
- Participar na elaboração material de comunicação
Claro que o escopo de atuação do BGO deve ser definido pelo Presidente do Conselho ou do mais alto órgão da administração, a diretoria executiva, por exemplo e para o desempenho da função, o BGO deve se apropriar do conjunto de documentos de governança para garantir aos agentes da governança uma contribuição efetiva e orientações sobre aspectos regulatórios, obrigações, direitos. Além disso, deve ter em mente e domínio o seguinte contexto de abrangência:
- Ambiental:
- Legislação e regulação
- Autorregulação
- Boas práticas de governança
- Cultura
- Agentes e órgãos
- Partes interessadas
- Sócios
- Conselho de administração / consultivo ·
- Conselho fiscal
- Comitês
- Secretaria de governança
- Auditorias independente e interna ·
- Diretoria
- Ferramentas
- Calendário anual
- Agendas ·
- Atas de reunião
- Propostas de deliberação ·
- Portal de governança ·
- Avaliação do conselho e dos conselheiros
- Documentos
- Acordos: de acionistas e sócios ·
- Estatuto ou Contrato social ·
- Regimentos internos ·
- Políticas, normas e alçadas
Essa abrangência requer que o perfil desse executivo seja uma pessoa com capacidade de comunicação horizontal e vertical, articulado e pense sempre na integração. Deve possuir um alto grau de discernimento sobre ética e comportamento de confessionário no diz respeito à confidencialidade. Como o BGO atua como agente integrador, a função requer muita sensibilidade e percepção sobre tudo e todos, o que exige alto nível de inteligência emocional e discernimento.
Deve possuir uma capacidade de enxergar o todo, a “Big Picture” e visão estratégica do business. Como há a recomendação para que o reporte seja ao Presidente do Conselho, espera-se independência em todos os sentidos e o comprometimento com o escopo da função. E um perfil como esse, se já vier com uma credibilidade já conquistada, fecha com chave de ouro.
Em outra mão, somente as empresas que possuem conselho estruturado devem ter um BGO? A resposta é não! Como visto, um BGO, embora aqui desenhado tenha essa direção, qualquer empresa que tenha uma estrutura minima de governança podem usufruir dos benefícios desse professional, pois ele pode atuar como apoio entre sócios, família e propriedade. Pode servir como dito anteriormente, de ponte entre diretorias, assembléias, comites e a familia (se for o caso).
Não existe modelo de governança pronto e ele deve permear as necessidades da organização, dos seus stakeholders e sócios. Isso significa que um BGO com amplo ou reduzido escopo de trabalho deve refletir essa realidade de modo a se ajustar ao momento, maturidade e particularidades de cada organização.
E como essa é uma função que surgiu muito recentemente, há ainda muito espaço para ajuste fino, avanços e melhorias.
Carlos Alberto Rasini, PhD, Msc. em Adm. de Empresas, Economista, Conselheiro Independente, Professor, Executivo na W2COnn e na iBluezone. Escreve sobre reflexões da vida, empresas, negócios e governança.